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Isto é um palco, é um teatro aberto,
um covil mal composto, atravessado,
não existe moral e é incerto
o caminho que leva a qualquer lado.
apesar do principio sem limites
não ter de si nem portas, nem fronteiras,
uns criaram aos outros apetites
que se espalharam pela terra inteira.
aprisionando á força a alma humana
em grades de poderes e de importância,
em milénios de dor e de ignorância
a energia ou massa, em carne abana,
nem ómega nem alfa, mas excrescência
que não usa cabeça, nem experiência.
Três séculos e meio cedro amigo
tanto tempo de vida sem queixume
tantos ossos queimados sem ciúme,
de tanta geração, sonhado abrigo.
tu que já viste frades e poetas,
navegantes e reis e bailadores,
observaste, sofrimento, amor,
aconselhaste sábios e profetas.
chamam-te S. José mas não és santo,
és cedro, isso te basta, serpenteias,
acima do meu mundo e incendeias
ramos á luz do sol que são teu manto,
fazendo-te coroar ,és realeza
dominante da tua natureza.
Gosto de me perder nos teus caminhos
de mata antiga, troncos centenários,
errando-me contigo, desalinhos
dum húmus que nos fez aqui gregários.
revejo-me nas sombras dos gigantes
modelados nas tuas curvaturas,
monumentos de artérias, beligerantes
da terra á luz, no nada das procuras .
tens o controle do tempo, espaço ameno
pelo sangue que te sulca todo o ser
onde por mim me busco , ter um dreno,
na vida dos teus ramos a crescer,
eu, que ao pé de ti sou um pequeno
e inútil deus quase a desaparecer.
O novo dono do casaco preto
tomou-o de comprado, tão poído
que ao vesti-lo se sentiu despido,
por dentro se fechou como num gueto.
destes actos sobrou, ficou latente
uma memória nunca dissipada
uma tísica dor, por fora nada
além de espelho claro e evidente.
não tinha cor , o fio entrelaçado
de tão usado não servia já,
eram contas de vida que não dá
vividas e cumpridas noutro lado,
entranhou-se na alma inexperiente
e nela fez morada permanente.
Encostas a cabeça no meu peito
e dormes confiante, desnudada
esticas o teu corpo pões um jeito
na minha alma que trago interrogada.
depois acaricio os teus cabelos,
amasso-te o pescoço sem censura,
com as mãos percorrendo, são novelos
de sensações e gestos de ternura.
silencias-te em sonhos, embalada
como se eu fosse teu divino amante
platónica figura de gigante
no ego em que te encontras aprazada,
os teus dedos soletram , adormeces
na ingénua pureza que mereces.
É noite de natal, arde a madeira
são veios de carvalho retalhados
repartem-se em calor, fogo, á lareira,
remanescencia dos antepassados.
o frio está lá fora ,o azedume
corre por mim, talvez leviandade
ver o natal num grito, num queixume,
por quem morre de fome e de verdade,
por quem vive servil na ignorância,
quem se abusa por outro, á escravidão,
quem se perde na falta duma esperança,
quem se aluga pelo valor dum pão,
ou quem se prostitui pela abundância
calcando aos pés o homem, seu irmão.
Se hoje fosse dia de Natal,
mas não é, oferecia-te uma flor,
talvez no teclado e virtual
pedisse um beijo, um beijo com amor.
não acredito no menino Jesus,
porém creio em meninos todos os dias,
são eles todo o homem que produz
o amanhã , depois, depois e crias.
acho o natal uma festa pagã,
e tão de fora do nosso próprio ser,
como uma cesta de ovos, sem os ter.
dizer natal, natal, é coisa vã,
se em qualquer outro dia acontecer
será que outro natal não pode ser ?
Três séculos e meio , cedro antigo
tanta idade a viver sem um queixume,
tantos ossos queimados, tanto lume
de tanta geração sonhado abrigo.
tu que escutaste frades e poetas,
navegantes e reis e bailadores,
testemunhaste sofrimento , amor,
talvez de sábios, santos e profetas.
chamam-te S. José , mas não és santo,
és cedro, bem melhor e serpenteias
acima do teu mundo envolto em teias
do corpo que te envolve em verde manto,
mas por baixo és esqueleto aplicado
já com aço e cimento, segurado.
O dia de natal é tão diário
como outro dia é dia qualquer
não mais que convenção num calendário
como o nome dum homem ou mulher.
o dia de natal tem existência
para sustentar enganos , sucção
de quem rouba do mundo a inocência,
de quem fomenta guerras e exclusão.
o natal não é sonho nem é quente,
muito menos é dar, é sofrimento,
é mentira, negócio, aviltamento.
pois se houvesse natal, naturalmente
na mente , instinto em nós, amor seria
que a cadeia dos genes transmitia.
Não são frades que me fazem a missa,
francamente não são o meu sustento,
é nas coisas do mundo que me aguento
não na ordem de classe submissa.
quando subo ao Buçaco é a nudez,
muitas vezes que me leva a subir,
deambular sozinho, perseguir
o interior moldável que me fez.
que altera na ignorância e pestilência,
de se passar obrigatoriamente
num sítio incompreensível e ausente
onde cada certeza é aparência,
enquanto este silêncio de oratória,
‘inda que breve, é pausa provisória.
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