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Sentado na coxia, o auditório
discursa, gesticula, nada escuto,
busquei-te Nefertite , provisório,
um cigarro na boca e devoluto.
percorro-te, rainha do Egipto
seguro-me ao teu ceptro de serpente
tua face dourada é o meu mito
vivo em ti ,morta, a vida do presente.
só eu te ouço em segredo quando choras
nos papiros do Nilo , estou sentado,
a palestra mexeu-se pelas dez horas
e tenho meu o teu olhar dourado,
no sarcófago em pó onde tu moras
num tempo já de si eternizado.
Pelo mar e reino atrás aqui jurei
eu que, navegador, Diogo Cão
o rio descobri e me embrenhei
por ele acima numa procuração.
batucam-me aos ouvidos os que estão
por eles e palavras me empenhei
eu que , navegador , Diogo Cão
á minha frente apenas tenho el-rei.
esta água não é fim de viagem,
com homens e enfeites no porão
vou atracar e ancorar á margem
eu que, navegador, Diogo Cão
manobro o mando que me dá coragem
e mando erguer ao alto este padrão.
A praça não é grande , dois pintores
preenchem uma sombra no vazio,
turistas observam, predadores
que inundam a cidade pelo estio.
a praça é de Van Gogh , são as telas
que querem respirar o seu autor,
os toldos, os plátanos, janelas,
restos do que foi pó demolidor.
na estreita rua , ao fundo, corre o rio
pressentido, folhagem, mês de Agosto,
passam mulheres despidas, desafio,
rubro conforto na cadeira posto,
num chapéu do bistro ,um sumo frio
tomado ao sol, luz a banhar-me o rosto.
Tenho um lugar , qualquer lugar do mundo,
não sendo Zeus , sou deus, sua demência,
de qualquer um, até que na aparência
a igualdade é grande , o dom profundo.
eu, que sou eu, igual, por isso a raça
é toda a raça a mesma semelhança,
no universo feito ou em mudança
pois em tudo o que for , mudança passa.
rápido, imponderável é o espaço
dos deuses digitais , outra aliança
monitorizo os ossos e amasso
a matéria divina que me alcança,
não sou Zeus, mas sou deus , deus que me faço
e desfaço na forma, sem parança.
Amareleceu-me o pátio , que palavra,
ficou ocre, castanho e desnudado,
fixo a cor no frio que me lavra
e me retém em casa abandonado.
voando folhas, são folhas de papel,
árvores que vão despindo o arvoredo,
improviso um metrónomo, cordel
que da janela movo com o dedo.
vejo o tempo a passar , quase lhe toco,
seguro-o na mão mas ele escapa,
passa-me á frente, é fio, não floco
e passa nu , sem um chapéu ou capa,
enquanto dentro olho e me desloco
na sua direcção como uma lapa.
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