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Um fim de ano qualquer, sem calendário
com a caneta em linhas de escrever
é espesso o véu sobre o lugar precário
onde suposto pensa e é o ser.
olho em redor, real imaginário,
de pontos que não têm que fazer,
e que sou afinal ? um panfletário
de versos que nada podem dizer
um ano, na loucura, é indiferente
arde o fogo sem tempo e sem razão
eu sou a multidão na minha frente
como ela sou o sim e sou o não
de restos de partículas cadentes
cinzas talvez , do espaço em combustão.
Não é Natal, ou é Natal, quem sabe,
o frio é intenso, o interior tão largo,
que o movimento eterno desta nave
é sonho breve, imaginado, amargo.
não é Natal, ou é Natal, sei lá
o que são deuses vindos do além,
reservo o pensamento no que há
meninos deste tempo , meu também.
acumulam-se os homens pelas ruas
no difícil saber ignorar,
almas atarefadas, passam nuas
olhos que no correr não tem olhar,
e o Natal , se o há, esse flutua
como uma tempestade sobre o mar.
Chega tarde o Natal em versos, odes,
lenda de minha trama evoluiu
não há menino, palha, nem Herodes
morto de vez em terra se sumiu.
nem sei bem onde fica a Galileia
para lá de Gaza, a faixa , e de saber
se o caos que agente tem é á boleia
se nele há gente feita ou por fazer.
á noite, fora, a luz da lua é fria
apara-nos a febre e o parecer
não nascem pobres deuses, porque havia
um pobre e velho deus reaparecer
quando há tanto Jesus em agonia
e tantos mais ainda por nascer !
Porque gritas mulher e porque choras
e suplicas ao carrasco a dor
porque te vai a vida nas demoras
ausentes e brutais do sonhador ?
porque se cala o som na voz do vento
que sopra sobre os choupos do Mondego
porque é achado o descontentamento
porque há-de o amor ser sempre escravo e cego?
porque choras Inês na margem bruta
dos amantes que perdem a razão
na lâmina afiada da disputa
da dor que amadurece a rendição,
fica na pedra o corpo, a alma , a luta
de ganho, eternidade em nossa mão.
O acidente a ocidente deu-se
e naufragou a armada de um navio
no porão de almas, a ralé perdeu-se,
o mar encheu de gritos o vazio.
na guitarra e no fado adormeceu-se
a revolta ,no choro e desvario,
de sorte e cruz a borrasca rendeu-se
e pedaços da barca vem ao rio.
mistério dos mistérios , desbravados
o mastro e o convés pairam na areia
tábuas e mortos, peixes , desgraçados,
misérias do partir que se receia,
lamentam-se na praia os afogados
que a tempo não fugiram desta teia.
Não sei se alguma vez quis ser feliz
como se rio fosse, sem secura,
depois de tantos anos de aprendiz
que me resta afinal, senão rasura?
tenho-me dito tantas vezes, pára
como aragem que nasce á luz difusa,
mas é raro parar , levanto a cara
caminho laminar e em recusa.
cego e louco julgar, o possuir,
que é irreal em toda a nossa espera,
opaca nuvem é , é um fingir
a rapidez que passa e se tolera
um dia , ao acordar, nada há-de vir
sobre a mesa vazia da quimera.
Passo, passo por ti, nada te digo
nos passos onde leve me sustenho,
meus passos já não vão a par contigo
nem eu ao certo sei aonde os tenho.
do rotativo sonho me desligo
por mim encadeado em próprio amanho,
são as coisas da sorte o novo abrigo
ao ir no ir de onde já não venho.
enquanto o sol me espreita radioso
se o vejo chegar desalinhado
vi-te a última vez, fóssil zeloso
por onde rasguei vidas e pecado,
não fosse o tempo breve e ardiloso
e eu passava por ti, mesmo parado.
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