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E vós tágides minhas que de aperto
me levais Tejo fora noutra rota
me haveis de dar da pátria infima nota
para que de longe, algures, me sinta perto.
pois que sendo este mar tão descoberto
desde o zarpar á ilha mais ignota
mais frouxo é o saber e mais remota
a sorte do percurso vago e incerto.
navegantes sem bussula e sem prumo
no marear as cartas de improviso
debitam-se em queixumes e sem rumo
as pimentas , os ouros , o juizo,
que se agitam as naus, ardem sem fumo
promessas para atingir o paraiso.
O acidente a ocidente deu-se
e naufragou a armada de um navio
no porão de almas, a ralé perdeu-se,
o mar encheu de gritos o vazio.
na guitarra e no fado adormeceu-se
a revolta ,no choro e desvario,
de sorte e cruz a borrasca rendeu-se
e pedaços da barca vem ao rio.
mistério dos mistérios , desbravados
o mastro e o convés pairam na areia
tábuas e mortos, peixes , desgraçados,
misérias do partir que se receia,
lamentam-se na praia os afogados
que a tempo não fugiram desta teia.
O meu país é mar e comedoiro
fugaz, escancarado e sem sustento
é barril de galego alma de moiro
o meu país é um adiamento.
o meu país é fossa, sumidoiro
a quem lhe quer é brusco e é tormento
espantoso milagre , ancoradoiro
é a deriva que o traz ao vento.
o meu país tem face inacabada
por mão de artista não de timoneiro,
o rumo que persegue é na coutada
de si próprio, carrasco , prisioneiro,
o meu país que é tudo não é nada
não passa de um quintal todo porreiro.
Voltei ao mar, voltamos sempre ao mar
este país sem fim em tudo é sal
e na praia se morre a divagar
na borrasca que varre o areal.
é naufrágio, constante naufragar
é a matriz , é mãe, um matagal
e tanta vez nos mata por matar
que ser órfão, aqui, é o normal.
talvez nos mova toda a insensatez,
seja demais a fome de sofrer,
não que seja este espaço a escassez
mas seja a escassez farto viver
em Portugal ,não para o português
mas para tanto ladrão que anda a comer.
O cigarro entre os dedos, o morrão
a cair sobre folhas de papel
perdidos na bancada , do melão,
três pelos sobre a orla de pincel.
por baixo a Bola, jornal de digestão,
bíblia e lume , suprema inteligência,
parece espelho , porca de nação
tão magra que se vê á transparência.
assim seja, silêncio, afinidade
á louvação do sim, não faz sentido,
numa trincheira aberta á cavidade
como osso sem cão ao cão estendido,
será a vida prisão ou liberdade,
ou apenas ganhar mesmo vencido???
No baraço do tempo, engulho de alma
transmontano viril ,sedento, crua
é a alma da pedra que se espalma
em amargura vil, no meio da rua.
no granito do berço onde se acalma
a caneta pela pele como charrua,
em torgas , no silêncio, aurora de alma
crença que ora se firma ora flutua.
e do odre do berço a revelia
debruçada no Largo da Portagem
é pureza de amor ou agonia
numa cidade apenas só de imagem,
então da verve brota poesia
que é terra mãe , sempre ingrata e selvagem.
Gostava de me ter em ti, ceifeira
se o tempo fosse igual para nós dois,
mas de voltar atrás não há maneira
não há replicações anos depois.
gostava de me ver em ti, ceifado
por poemas que deixaste ficar,
ou ser príncipe novo em teu reinado,
pelo menos mais um a questionar.
porém o tempo, a simultaneidade
biológica, no acto foi diferente,
o campo misturou-se na cidade
os anos que me turvam são á frente,
mesmo que fosse rei na eternidade
duvido dominar todo o presente.
pois nem sei o que sou para saber, existo, logo penso vejo e vou mas não sei onde vou nem o que ver. não sei se eu sou eu nem onde estou, não o sendo que venho aqui fazer, serei eu positrão que se enganou, serei manhã , serei amanhecer??? estranha coisa vir, amar, morrer, num infinito olhar que se encontrou, não ser aura ,futuro ou entender por que se veio e porque se acabou aquilo que não foi nem há-de ser, mas estranha foi a coisa que passou.
O capitão cresceu, o mar rugiu,
rostos escancararam o terror
que a proa levantou , submergiu
a tempestade e o Adamastor.
Dias ergueu a mão , o indicador
deu rumo avante na onda que caiu
sobre todo o convés, assustador,
o inferno que veio e os sumiu.
a meio da noite o rumar foi nordeste
ventos vinham do sul e de feição
amainou-se a borrasca , azul celeste
trouxe a manhã de abertas e razão
quando a terra surgiu, recorte a oeste
e porta aberta a nova compreensão.
Pelo mar e reino atrás aqui jurei
eu que, navegador, Diogo Cão
o rio descobri e me embrenhei
por ele acima numa procuração.
batucam-me aos ouvidos os que estão
por eles e palavras me empenhei
eu que , navegador , Diogo Cão
á minha frente apenas tenho el-rei.
esta água não é fim de viagem,
com homens e enfeites no porão
vou atracar e ancorar á margem
eu que, navegador, Diogo Cão
manobro o mando que me dá coragem
e mando erguer ao alto este padrão.
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