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Desta alegria canta a aparência
canta o poeta eterna partitura
a natureza e a manifesta essência
do primeiro vestir de criatura
escreve poeta agita a turbulência
na emotiva peça da loucura
canta as flores e vive a insolvência
da substância amarga da aventura
canta e sublima a voz da primavera
que se refaz seara criativa
canta o sol o perfume a atmosfera
os princípios do acaso que é a vida
canta poeta o sonho e a quimera
que da morte regressa renascida
O muro que me separa de mim
alto e silencioso ao comprimento
multiplica-se e fecha-se sem fim
volta sempre á origem do meu senso
tem portas que não abrem nem as penso
odorosos perfumes de jasmim
são o que são e soltas no meu lenço
fechadas e seladas são assim
e sei que sendo eu pequeno e breve
como mínima parte do cordão
tomo e deixo as soleiras ledo e leve
como efémera bola de sabão
na pequena existência que se deve
a poeiras e pó de combustão.
Sou um tipo danado digo ás vezes
de mim para mim portas atravessadas
não gosto de cenouras nem chineses
e sou silva de nome em papeladas
não tenho sorte ao jogo e dos amores
contra o jargão o dom é impreciso
teimoso resmungão e nos sabores
um curioso autor do improviso
nesta banalidade estabelecida
pela genética herdada dos avós
ancoro o bote ao cais duma partida
e parto sem partir da minha foz
enquanto enrolo o tempo e esta vida
num verso num café calando a voz.
Do silêncio interior arde-me sede
e das ânsias mil gritos estrangulados,
recuo aos meus limites de parede
e os sinos dobram, secos e pesados.
tão pesados na Sé que deixa o largo
como deserto em pedra de calçada
e o apoio do chão, inquieto, amargo
hesita no torpor duma passada
é meia noite, o lampião flutua
quando lhe sopro para não se mexer
e a luz, cai na janela , cai na rua
e na regra que marca o amanhecer
e sigo por ninguém , que nem a lua
espreita do céu para me receber.
Que vento sopra e neve cai ! Manhã
que se desmonta e veste de cinzento,
da janela observo e me contento
tossindo sob o meu cachecol de lã.
saio, atravesso a rua e num momento
empurro a porta da tabacaria,
cigarros e jornal, lixo, mania,
tóxico da rotina e pensamento.
hoje, segunda feira, clonada,
como és injusta incómoda ciência,
que de mim fazes massa e transparência
fotão, carbono e água destilada,
um morrão no cigarro e paciência,
vento que sopra a neve, cai , mais nada.
O que me leva é o vento que passa
o que me empurra és tu, tempo perdido,
o que me chama ,nada , satisfaça
ou não o que me julgo era devido.
o que me grita é chuva que me grassa
por sobre um esqueleto ressequido,
ela me encharca, o mito me ameaça
e tudo deixa então de ter sentido.
e pasmo, surdo a deus, por mais que faça
levantar-me do corpo adormecido,
não sei se sou estrutura de carcaça
se castanheiro velho, oco e despido,
silêncio de ninguém que me embaraça
inerte, ignorante , ou esquecido.
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