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Neve de Goteborg que me tens
reduzido ao que sou frio calado
a janela da rua os armazéns
um olhar comedido camuflado
ficou mais noiva a noiva da cidade
no manto que entretanto se refez
árvores que a noite faz claridade
barcos que se recortam no convés
leva-me a floresta os pensamentos
que os percorro só silenciado
neve que cai por mim por uns momentos
a maior parte cai por todo o lado
eu próprio vou calcando movimentos
umas vezes andando outras parado.
Frágil e velha barca se adormeço
me vou por ti sem leme e sem rumar
nos atilhos do cais sem endereço
finjo ser o partir sou o ficar
sem bussola na bruma onde me esqueço
de onde é o norte e a estrela polar
navego o nevoeiro denso e espesso
nas memórias que tenho a naufragar
rasgo do vendaval a violência
desprovida de vento e de razão
já marujo não sou nem experiência
nem o delírio à solta dum tufão
regresso sem partir á procedência
sobre o resto das tábuas dum porão.
Neve em Paris, cai leve , leve e fria
o rubro do bistrô emudeceu,
nas ruas da manhã que se anuncia
passa gente a correr, amanheceu.
cobri o corpo á hora que partia
da minha estrada o tempo que cedeu
neve em Paris, no Verão não sucedia
e foi no verão que tudo aconteceu.
entro no autocarro, o vinte sete,
que me leva abrigado sobre alvura,
passa gente a correr que se intromete
no dia fustigado de espessura,
desço por fim do carro em Chatelet
dobrando á neve a face e a figura.
Que vento sopra e neve cai ! Manhã
que se desmonta e veste de cinzento,
da janela observo e me contento
tossindo sob o meu cachecol de lã.
saio, atravesso a rua e num momento
empurro a porta da tabacaria,
cigarros e jornal, lixo, mania,
tóxico da rotina e pensamento.
hoje, segunda feira, clonada,
como és injusta incómoda ciência,
que de mim fazes massa e transparência
fotão, carbono e água destilada,
um morrão no cigarro e paciência,
vento que sopra a neve, cai , mais nada.
Gostava de me ter em ti, ceifeira
se o tempo fosse igual para nós dois,
mas de voltar atrás não há maneira
não há replicações anos depois.
gostava de me ver em ti, ceifado
por poemas que deixaste ficar,
ou ser príncipe novo em teu reinado,
pelo menos mais um a questionar.
porém o tempo, a simultaneidade
biológica, no acto foi diferente,
o campo misturou-se na cidade
os anos que me turvam são á frente,
mesmo que fosse rei na eternidade
duvido dominar todo o presente.
pois nem sei o que sou para saber, existo, logo penso vejo e vou mas não sei onde vou nem o que ver. não sei se eu sou eu nem onde estou, não o sendo que venho aqui fazer, serei eu positrão que se enganou, serei manhã , serei amanhecer??? estranha coisa vir, amar, morrer, num infinito olhar que se encontrou, não ser aura ,futuro ou entender por que se veio e porque se acabou aquilo que não foi nem há-de ser, mas estranha foi a coisa que passou.
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